Ensinamentos

Na casa de minha mãe era difícil ter voz própria, expressar opiniões, sair do lugar da obediência quase cega. Um tio meu abriu meus olhos para as múltiplas vozes, para entender que através da palavra escrita se podia ter liberdade e ir longe. Usei esse poder no colégio, em dissertações e questões de interpretação de textos. Aderi a um clube de Amigos por Correspondência que me possibilitou escrever cartas para desconhecidos, pessoas de outros países e culturas. Me correspondi durante muito tempo com um rapaz de Malta. Treinei meu inglês e passei a conhecer uma pessoa inteligente e culta, com senso de humor e aguçado espírito crítico. Mas, tempos depois, percebi que ele estava apaixonado por mim e desejava vir ao Rio para me conhecer. Fiquei assustada achando que tinha ido longe demais. Então, inventei um namoro sério, mencionava nas cartas que estava apaixonada e era correspondida e ele parou de me escrever. Perdi um amigo, e descompliquei minha vida.

Anos depois convivi com uma pessoa brilhante: meu professor de Inglês e de Literatura no colégio americano onde estudei e terminei o ensino médio. Ele solidificou em mim o valor da escrita e o apreço à literatura. E, principalmente, me mostrou o caminho da expressão dos sentimentos também ao se realizar um trabalho, não importa qual.

Trabalhando como professora na EAV, conheci meu mestre fotógrafo que vinha de São Paulo semanalmente para encontros com um grupo de artistas. Eu era a assistente dele, e foi um 

privilégio, um dos maiores lances de sorte em minha vida. Com ele eu me senti artista. Encontrei minha expressão fotográfica, e ganhei muitos ensinamentos para aplicar em sala de aula como professora. 

Não leciono mais, mas continuo com meus projetos pessoais, pois expressar-me é fundamental. Juntei tudo que meus mestres me passaram e investi mais seriamente na escrita. Sinto que encontrei minha voz.

Crio, imagino, invento, deliro, não há regras. Sigo meus instintos, faço o que gosto e como gosto sem fórmulas ou receitas. Em certos trabalhos, revejo minha história, esmiúço minha memória do passado e tento interpretar tudo com os olhos do hoje, do agora. Algumas dessas relembranças desaguam em textos, outras em imagens. Outros trabalhos meus refletem o que me chega do mundo, do que ouço ou vejo à minha volta.

Então, unindo essas três influências, posso dizer que:

. meu tio me abriu os olhos para que eu desenvolvesse a capacidade de avaliar as coisas com       bom senso e clareza; 

. meu professor de literatura expandiu meus horizontes com um entusiasmo contagiante;

.  e as aulas do mestre paulista, seu modo de ver e pensar a arte da fotografia, foram fundamentais para que eu encontrasse o meu caminho como artista.

Ao introjetar esses ensinamentos consegui ampliar e consolidar minha identidade criadora.

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