Amor! Amor

Dizem que o primeiro amor é o colo quente da mãe. Mas desse não lembro, ainda não havia para mim a linguagem. Talvez fosse forte, mais forte do que qualquer palavra que só viria depois. Exigência? Lógica? Inexistiam. Esse primeiro amor nada pede, nasce atrás dos olhos fechados.

De corpo pequeno, amava coisas — sim, as coisas têm alma quando se desconhece as durezas do mundo. Minha bicicleta caramelo, com sainha colorida na roda traseira, era meu tesouro. Nela eu era vento, era raio, era pássaro num céu que não conhecia peso.

Depois chegaram aqueles com olhos, cabelos, cheiros. Sentia um amor que não dizia, era um incêndio escondido. Ninguém notava, mas eu morria mil vezes todos os dias. Estranho, pois me fazia viver mais.

O primeiro beijo, um susto. Tão rápido que não soube se gostava. Mas depois era repetir, repetir e repetir. Queria entender porque meu coração virava do avesso e parecia explodir. Mas o namoro acabou, e com ele foram-se os beijos. Achei que era o fim de tudo, mas o sol teimou em nascer como se nada tivesse acontecido.

E veio um amor sério, um território novo. Precisava pisar com cuidado quando, na verdade, queria correr até perder o chão.  Conhecer um outro corpo tão próximo? Difícil.  Como tocar, acarinhar? Muito a aprender. Minha ternura tímida pulsava nos mais loucos ritmos. Havia amor, um amor que ainda não sabia onde morar.

A primeira vez foi silêncio. Em nada pensei, mergulhei. Depois éramos urgência, sem tempo, sem mundo, sem pele entre nós. Dois corpos a se devorar na calma da eternidade.

Entrei na dança, casei, o amor se vestiu, aprendeu a se controlar, a dividir tudo: espaços, tempos, até o ar. Sexo sem pressa, podíamos esperar. Às vezes um toque inesperado, um olhar, uma data… E tudo voltava como uma maré descontrolada. Por instantes éramos os mesmos de antes.

Agora, sinto que o tempo me moldou. O corpo, mais paciente, não chama tanto como antes, mas um carinho na nuca pode comover mais do que o mais selvagem dos desejos. É outro tipo de amor, um amor de dentro, sem nome, sem fim.

Me pergunto: algum amor vai embora? Nenhum. Talvez o amor seja, por definição, partir e ficar ao mesmo tempo. Acho que quando tudo parece se desfazer é o amor que nos costura por dentro com linhas invisíveis, mais fortes que aço.

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