Escrevo, por quê?
Escrevo porque a escrita é meu lugar de fala, a fala que precisa passar mesmo que à revelia, mesmo que bem baixinho, indo bem longe ou soando bem perto. É voz que esclarece, conserta, complica, inventa, mente e revela muito sobre mim como pessoa e escritora.
Desde sempre penso muito, imagino, crio, invento. Na infância, me calei para me poupar das censuras e críticas. Não ousava me expor, mostrar o que se passava dentro de mim. Então, para dar toques de alegria, pitadas de interesse à monotonia e rigidez que me cercavam, eu falava comigo mesma, criava diálogos entre minhas bonecas, montava cenários para que neles minhas criações existissem e falassem por mim. Tímida, não ousava revelar meu mundo interior para ninguém com receio de ser destruída. De uma certa forma, foi bom porque pude me conhecer melhor, preservando e fortalecendo minha individualidade.
Bem antes de me alfabetizar já gostava das letras. Não sabia que eram ferramentas para a comunicação oral e escrita. Admirava-as como desenhos. Via letras como traços dançando no papel, formas que se transformavam — com plasticidade e beleza. Desenhos que bailavam livremente para mim. Com lápis, papel, e gestos eu dava vida ao que as letras me transmitiam. Ora pequenas, ora imensas, ora se diluindo, ora se concentrando, voávamos juntas.
Até que um dia, percebi que elas tinham som! Um “B + A” soava como “BA”. As ligações foram feitas, e aprendi a ler. Passei a ver as letras unidas, organizadas, formando sons que correspondiam ao que se falava, ao que eu ouvia. AH! Perdi a inocência. Letras eram sons desenhados. E fui me dando conta de que carregava em mim uma imensidão de sons — enclausurados, calados, escondidos.
Quando aprendi a escrever, entendi que estes sons iam para o papel para serem lidos. Não seriam mais somente meus, seriam de todos que os lessem, não importando se agradavam ou desagradavam aos leitores.
A escrita é a minha voz, é para ser ouvida. Voz soando alto ou baixo, indo longe ou bem perto, mas sendo minha expressão, me revelando para os outros e para mim.
Hoje, tenho coragem de me expor e escrevo. Meus escritos não podem ficar sufocados em mim ou largados em gavetas, têm que ter vida própria. Resgatei minha voz com a escrita. Vitoriosa, sinto que escrever alicerça meu desenvolvimento artístico, criativo e, acima de tudo, pessoal.
Ruth Lifschits